Matéria publicada no site da CNN Brasil, com o título Adolescentes usam redes sociais para se diagnosticarem com TDAH, autismo e outros distúrbios, é iniciada revelando uma tendência crescente desde 2021 e uma preocupação dos pais.
O seu primeiro chamariz é o depoimento de um pai, que alerta para a busca incessante de sua filha de 14 anos por vídeos sobre diagnóstico e saúde mental.
Um recorte da matéria diz: “com o tempo, a adolescente começou a se identificar com os criadores, segundo sua mãe, e se convenceu de que tinha os mesmos diagnósticos” que eles. A adolescente teria passado por alguns especialistas, que eliminaram todos os autodiagnósticos, deixando-a com apenas um diagnóstico: ansiedade severa. Parece que, apesar da bateria de testes e consequente resultado, ela não concorda com os especialistas.
Após esse caso, a matéria sugere que duas dúzias de pais depuseram sobre situação semelhante para a CNN Brasil e alguns ainda comentaram que “a mídia social ajudou seus adolescentes a obter as informações de saúde mental de que precisavam e os ajudou a se sentirem menos sozinhos”.
Bom, a busca de diagnósticos na internet não é incomum. Segundo pesquisa do TIC Domicílios, de 2021, 50% dos brasileiros buscam informações sobre saúde na internet, sendo que grande parte usa o Google. Ou seja, o autodiagnóstico na internet não é uma invenção adolescente, há um movimento anterior e consistente nisso. E nem ouso aqui discutir a fidelidade sobre sintomas e dos autodiagnósticos.
Mas, um ponto precisa ser observado: os critérios de resposta para as buscas são algorítmicos. Isso significa que o critério não é a entrega de uma informação especializada. Óbvio, que há outros fatores que podem nos deixar de orelha em pé, como publicações patrocinadas ou posts aparentemente genuínos de influenciadores, com um tom de “it’s me”.
E é nesse “it’s me” onde está o “pulo do gato” que nos interessa: na matéria, a mãe diz sobre identificação com os criadores. Mais tarde, aparece também o quanto os adolescentes se sentem menos sozinhos.
Haja vista que a puberdade é um advento, conforme aponta Freud (1905), ou seja, aquilo que se inicia como algo jamais vivenciado, ela também se configura como o trauma da reedição da sexualidade infantil, podendo ser dimensionado pelo luto da perda do objeto e de investimento libidinal; assim como pela melancolia com a perda do próprio eu (Freud, 1917).
Diante dessa perda do eu, onde o puber não se reconhece mais, é que se busca uma resposta para uma falta, em relação íntima entre laço social e identificação, como um movimento de apropriação de características do outro externo para se fazer adolescente.
Ao buscar dar sentido sobre as suas sensações, sentimentos, enfim, sobre a sexualidade que pulsa em si, o adolescente parte da necessidade de estruturar a própria subjetividade, fantasiando que o outro exterior (a.k.a os criadores de conteúdo, e não mais os pais) possui as respostas que ele não tem; ou, ainda, como diria Lacan em Outros Escritos, ele está se virando com o não-todo. Afinal, “não há língua que não se force a isso, não sem queixar-se que faz o que pode”.
Acredito que, por um caráter ético e de cuidado, a matéria não entreviste os adolescentes autodiagnosticados pela internet. Mas, é importante salientar que, em um tratamento psicanalítico, tanto eles quanto a família precisam ser dialetizados.
Pois, não se trata apenas de validar quaisquer diagnósticos, uma vez que esses correm o risco de segregar e deixar escapar outras composições do sujeito. E sim de oferecer novas ações possíveis para o adolescente construir-se e saber de si.
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